Praias de duas cidades paulistas lideram ranking de poluição por plástico

Estudo foi realizado pela Sea Shepherd Brasil

Praias de duas cidades paulistas lideram ranking de poluição por plástico

Praias urbanas têm mais lixo. Foto: Pixabay

As praias de Mongaguá e São Vicente, na Baixada Santista, litoral de São Paulo, estão nos dois primeiros lugares do ranking das praias mais poluídas com plásticos de toda a costa brasileira. É o que aponta um estudo inédito realizado pela Sea Shepherd Brasil, organização de conservação marinha, em parceria com o Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP). O estudo analisou 306 praias de todo o litoral brasileiro.

Mongaguá é a primeira em microplásticos e São Vicente lidera em macrorresíduos. São duas categorias diferentes da poluição por plásticos.

Em praias de São Vicente foram encontrados 10 resíduos plásticos por metro quadrado de areia. Em Mongaguá, o cenário foi considerado mais alarmante, com a presença de 83 fragmentos de microplástico por m2.

A reportagem do Estadão procurou as prefeituras de Mongaguá, São Vicente e Florianópolis e ainda aguarda retornos.

O projeto Expedição Ondas Limpas percorreu as praias de 201 municípios dos 17 Estados da costa brasileira analisando a presença de plástico ao longo de 7 mil quilômetros de litoral, do Rio Grande do Sul ao Amapá.

O trabalho de campo foi realizado de abril de 2022 a agosto de 2023. A análise dos dados colhidos mostrou que:

– 100% das praias do Brasil contêm resíduos plásticos, como embalagens e tampas de garrafas;

– 97% apresentam microplásticos – partículas inferiores a 5 mm;

– Do total de resíduos achados nas praias, 91% eram plásticos, percentual superior à média mundial, de 70%, segundo o estudo;

– Entre os resíduos mais encontrados, os filtros de cigarro representaram 25% do total.

No Brasil, a região Sudeste lidera em resíduos plásticos maiores, chamados de macro resíduos. Já em macro plásticos (pedaços grandes de plástico), a região Sul empata com o Sudeste. Além disso, o Sul se destaca com uma quantidade maior de microplásticos (pequenos fragmentos de plástico) em comparação com outras regiões.

A praia de Pântano do Sul, em Florianópolis, é a que mais se destaca em termos de poluição por macro resíduos, macro plásticos e microplásticos, com mais itens do que em qualquer outra, segundo o estudo.

A Praia do Rizzo, também em Florianópolis, aparece como a terceira mais poluída por microplásticos, precedida apenas pela Praia do Centro, em Mongaguá.

A Praia das Vacas e Itaquitanduva, ambas localizadas em uma área de proteção integral, em São Vicente, são as segundas mais afetadas no ranking de macro plásticos

Os apetrechos de pesca, como redes, linhas e boias, representam 1 em cada 10 itens encontrados na costa brasileira, indicando falhas na fiscalização, especialmente em áreas de proteção integral, segundo o estudo.

Esses materiais correspondem a 11,2% dos plásticos e 10,3% de todos os itens analisados. O Rio Grande do Sul destaca-se com uma quantidade de resíduos relacionados a apetrechos de pesca três vezes superior à média nacional.

Estados com pequena faixa litorânea também sofrem com poluição

Mesmo Estados que têm uma pequena faixa de litoral, como Piauí e Paraná, não escapam do problema. Esses Estados lideram o ranking de microplásticos, com uma média de 10 fragmentos por metro quadrado, o dobro da média nacional.

O Estado do Rio Grande do Norte é notável por sua elevada taxa de macrorresíduos, com três de suas cidades figurando entre as cinco mais poluídas do país.

No Brasil como um todo, 91% dos resíduos coletados nas praias são plásticos, mas no Sul esse número é ainda maior, chegando a 95%, a maior porcentagem de todas as regiões.

Conforme o estudo, em meio a um cenário preocupante de poluição por plásticos nas praias brasileiras, Turiaçu, no Maranhão, se destacou como um oásis, com a ausência completa de microplásticos e níveis mínimos de macrorresíduos.

Praias urbanas têm mais lixo

Conforme a Sea Shepherd, o estudo é o de maior abrangência já realizado no Brasil para estudar o perfil do lixo marinho na costa brasileira. “Observamos que praias localizadas em áreas urbanas, onde há mais pessoas e mais atividade humana, tendem a ter mais microplásticos. Por outro lado, em praias de áreas suburbanas e rurais, que têm menos pessoas e menor movimento, encontramos menos microplásticos”, aponta o relatório.

Os pesquisadores observam que outros fatores, como a proximidade de rios e o transporte de resíduos pelo mar, podem interferir nessa presença de microplásticos.

“Embora a quantidade de pessoas na região seja um fator importante, não é o único que devemos considerar. Importante realçar que estes resultados são preliminares, no entanto, os achados atuais fornecem uma valiosa perspectiva inicial, que será aprofundada em breve no estudo final”, diz o relatório.

O documento alerta que, embora o estudo apresente um ranking das praias mais poluídas, os resultados devem ser considerados com cautela, devido à menor representatividade do tamanho das amostras em algumas áreas. “Ainda assim, esses dados fornecem uma fotografia indicativa relevante para gestores locais, ajudando a orientar ações de limpeza e preservação”, diz o relatório.

A equipe, integrada por uma coordenadora, dois cientistas, um fotógrafo, um motorista e uma cozinheira, percorreu de ônibus 7 mil quilômetros da costa, passando por 17 Estados. Mais de 100 voluntários apoiaram a equipe em rodízio.

A campanha Ondas Limpas foi apoiada pela Odontoprev, empresa de seguro odontológico. Foram coletadas e analisadas mais de duas toneladas de lixo contendo 120 mil itens, sendo 70% compostos de plásticos.

Para avaliar a presença de resíduos sólidos nas 306 praias analisadas, cada área de estudo foi delimitada considerando interferências como barracas, entradas de praia, além da linha mais alta da última maré e o início da zona de praia.

Para a coleta de macrorresíduos, foram definidas 4 seções (bandas de 5 m de largura), distribuídas aleatoriamente ao longo da área de estudo (100 m). A coleta de microplásticos foi realizada em 12 quadrados de 0,25 m², onde foram utilizadas peneiras de malhas específicas e água.

Ação da natureza reduz plástico a pequenas partículas

O estudo aponta que o plástico lançado diretamente nas praias ou carreado pelos rios que deságuam no mar são expostos à radiação solar, que degradam suas ligações químicas, tornando-os quebradiços.

Organismos marinhos, como cracas, também podem se prender aos plásticos, enfraquecendo o material.

O impacto das ondas e a abrasão da areia desgastam o plástico, reduzindo a pequenas partículas que entram facilmente na cadeia alimentar das espécies marinhas.

Todos os macrorresíduos encontrados dentro das seções foram pesados e categorizados in loco, enquanto os microplásticos foram enviados para análise em laboratório, onde foram classificados e identificados por cor, forma e tamanho com a utilização de lupas e microscópios.

Considerando a área total, o estudo concluiu que existem, em média, 4,5 microplásticos por m2 e 0,5 macrorresíduo por m2 de praia, portanto, 1 resíduo a cada 2 m2 de praia na orla marítima brasileira. De acordo com Nathalie Gil, presidente da Sea Shepherd, o plástico ainda está onipresente na vida das pessoas.

“Este projeto é um urgente chamado para entendermos de fato a situação do plástico de maneira aprofundada e abrangente. Temos a ambição de seguir lutando para que projetos de lei importantes como o PL 2524/2022 do Plástico e o PL 1874/ 2022 da Economia Circular no Brasil, assim como o Tratado do Plástico em negociações internacionais entre diversos países no âmbito da ONU, sigam evoluindo para a implementação”, diz, no relatório.

O PL do Plástico está em tramitação no Senado Federal. Já o PL da Economia Circular aguarda análise na Câmara dos Deputados. “Pretendemos que os resultados do projeto não somente choquem, mas provoquem a ação, trazendo à tona a necessidade de políticas públicas e de uma mudança na cultura de consumo do plástico no Brasil”, disse Nathalie.

A reportagem entrou em contato com o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas e aguarda retorno. As secretarias estaduais de meio ambiente de São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Piauí e Paraná também foram procuradas e ainda não responderam.

Raio-X dos resíduos na costa brasileira:

– 306 praias estudadas e 201 municípios cobertos;

– 156,6 mil metros quadrados de área analisada (equivalente a 22 campos de futebol);

– 91% dos resíduos são plásticos; 61% plásticos de uso único, 22% plásticos de longa vida e 17% apetrechos de pesca;

– 97% das praias têm microplásticos;

– 100% das praias têm resíduos (lixo) – Foram coletados 16 mil fragmentos de microplástico e 72 mil microrresíduos;

– Em média, são 4,5 microplástico por m2 e 0,5 macrorresíduo por m2 nas praias brasileira;

– 1 em cada 12 itens é filtro de cigarro.