Walter de Afogados ressurge como trilha sonora da juventude pernambucana
Com mais de 50 anos de carreira, as músicas do cantor são passadas de geração em geração
abril 18, 2024 - 8:00 am

Walter de Afogados é considerado uma lenda no cenário do brega. Foto: Júlio Gomes/LeiaJá
Há bens que são repassados de geração em geração, como um tesouro de família. É assim que o legado do cantor e compositor Walter de Afogados, 72 anos, tem se perpetuado. O artista vive um novo auge na longeva carreira e é inegável: o Rei do Salão se tornou parte da trilha sonora da juventude pernambucana.
São 53 anos de carreira, entoando canções que falam sobre amores, desilusões, iguarias famosas do estado, negritude e tantos outros temas que compõem sua trajetória. Hoje, é possível observar um novo grupo de fãs que declaram seu amor nada secreto ao artista.
“Ouvir Walter de Afogados é reviver memórias da minha adolescência, momentos que vivenciei junto ao meu pai, familiares e amigos”, afirma a auxiliar de reservas Kamila Lira, 26 anos. Ela também disse como teve contato com o artista: “Conheci através do meu pai, que sempre que podia escutava músicas nesse estilo. Não só meu pai, como a maior parte da minha família. Isso fez com que eu criasse interesse em ouvir suas músicas”.
Com mesmo carinho, a universitária Jéssica Dahab, 26 anos, relatou sua história com o cantor. “Sempre escutei brega antigo, por conta dos meus pais e vizinhos. Aqui na minha comunidade, Walter é bem popular na casa de várias pessoas. Quem me apresentou quem era o cantor por trás dessa voz marcante foi minha mãe”, conta.
Ela ainda destaca uma memória afetiva que a acompanha: “Ano passado, ele fez um show aqui no meu bairro, numa festa de São João e foi incrível a energia. Todo mundo começou a dançar, ele levou alegria para festa e muito carisma”.

Em uma análise, Amanda de Afogados, filha e empresária do artista, explicou que essa chegada de ouvintes mais jovens vem acontecendo há dois anos e que isso tem a ver com a união entre a nova e antiga geração de cantores do brega. “Teve agora o Novembro Brega, que estava lá os ‘boyzinhos’ tudo novinho, mas também tinha a antiga geração, que até saiu no Galo da Madrugada, e lá estava painho representando”, relembra.
Amanda também ressaltou o respeito que os ‘boyzinhos’ têm pelo legado do pai: “Todo mundo elogiando: ‘poxa, é uma lenda’; ‘é um ícone do brega’ e isso é massa.” Entre os nomes citados, Tocha, Anderson Neiff e MC Dread ficaram em destaque e podem ser as colaborações futuras de Walter de Afogados. Recentenmente, a música “A bola da vez” foi regravada em parceria com Jorge Music, no gênero piseiro.
Shows pela cidade
Entre os nove discos de estúdio, a juventude tem preferência pelo álbum Sonhos dos Sonhos, lançado originalmente em 1987. Os hits Ilumina, Morango do Nordeste e Menu Baiano são os sons mais pedidos nas apresentações do cantor.
E foi assim que aconteceu no bar Pega Liamba, no bairro das Graças. O público com perfil descolado surpreendeu o cantor que não imaginava ter fãs jovens e com repertório na ponta da língua.
“Tudo 100%, tudo legal. Eles cantavam comigo. Mas eles queriam mais o disco antigo [EP Morango do Nordeste]. Era eu cantando outras músicas e eles [cantando]: ‘A cor do amor é a cor da natureza’, Ilumina, e depois [dessa] foi o Morango do Nordeste”, relembrou o cantor, que já realizou três apresentações no local.
O sócio e curador musical do bar, Bidu Alves, 34 anos, falou sobre o compromisso de restaurar a raiz do brega. “O resgate dos artistas é sempre muito bem recebido pelo nosso público. Acaba se tornando um show nostálgico, em um espaço altamente atual. Vejo que a cada ano que se passa o brega toma rumos variados, deixando os bregas antigos ainda mais contemplativos”, afirmou.

No Carnaval do Recife, Walter subiu ao palco do Rec Beat, um dos polos mais frequentados da festividade, e que reúne atrações nacionais e internacionais. Ao LeiaJá, o Rei do Salão relatou um episódio inusitado que o impressionou na entrada do evento.
“Assim que eu cheguei, tinha um cara com um cartaz enorme: ‘Walter, nós viemos da Itália só pra ver teu show’. E eu fiquei: ‘Será que é verdade isso, meu Deus?’ E ele me abraçou e tirou foto junto”, disse o cantor.
Apesar de ter gostado do Rec Beat, o artista lamentou o tempo ter sido reduzido de 40 para 20 minutos de apresentação. “Gostei muito, fiquei muito lisonjeado no Rec Beat. Só não gostei muito do foi o meu tempo. Porque eu ia fazer quarenta minutos”, lamentou.
Amanda de Afogados, filha e empresária do artista, explicou que a situação foi causada pelo trânsito, que ganhou outras dinâmicas de funcionamento no período carnavalesco. “A gente se dedicou tanto, ensaiamos tanto, mas infelizmente o que prejudicou realmente foi o nosso translado pra gente chegar”, disse.
Ela afirmou que chegou a chorar nos stories, em que denunciou a ineficiência do acesso livre: “Para que serve esse acesso livre da Prefeitura se eu estou com um artista, que está quase perdendo o show, porque não está tendo acesso. Ele queria mostrar realmente o show, porque a gente fez um repertório especial”.
Mesmo com o contratempo, as canções de Walter de Afogados ressoavam no Cais da Alfândega, no bairro do Recife. Em uma postagem, o artista demonstrou sua gratidão: “Obrigado Deus por tudo que vem acontecendo na minha vida! Queria muito ter feito meu show completo, mas eu já estou muito grato a Deus por este espaço.”
E completou: “Ver o rosto de cada um de vocês me olhando com gratidão e cantando comigo do começo ao fim me fez acreditar ainda mais em mim, no meu potencial, isso me deu mais força pra continuar na batalha fazendo o que eu mais amo na minha vida, cantar e encantar a todos com minhas músicas!”